Formação de Multiplicadores Indígenas em Restauração Ecológica visa fortalecer a autonomia e o protagonismo indígena no trabalho com sementes nativas.
A coleta de sementes, uma atividade que faz parte do modo de vida dos povos indígenas, hoje, é também uma forma de conciliar a preservação da cultura e do meio ambiental com a geração de renda através da estruturação de redes de sementes. As oportunidades de capacitação para agentes indígenas da restauração, porém, não cresceram no mesmo ritmo que a demanda pelo trabalho desses agentes.
Assim, buscando fortalecer a autonomia indígena e capacitar lideranças indígenas para conduzir iniciativas de restauração ambiental em seus territórios, aconteceu o “Caminhos das Sementes”, primeiro módulo da Formação de Multiplicadores Indígenas em Restauração Ecológica (MIRE), entre os dias 4 e 8 de novembro de 2024 no no Centro de Inovação em Restauração de Ecossistemas Amazônicos da Ecoporé, em Rolim de Moura - Rondônia.
A atividade foi realizada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), com recursos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e em parceria com Ambientallis, Ministério dos Povos Indígenas, a Ecoporé e Escola da Restauração Ecológica na Amazônia, apoiado pela USAID por meio do Serviço Florestal Americano (USFS).
A gerente de sementes da Ecoporé e responsável pela Rede de Sementes da Bioeconomia da Amazônia (Reseba), Aline Smychniuk, foi uma das instrutoras deste módulo de formação. Segundo Aline, as redes de sementes são fundamentais para conservar, preservar e restaurar os serviços ecossistêmicos, pois "promovem a diversidade genética das plantas, essencial para a resiliência dos ecossistemas diante das mudanças climáticas".
Aline Smychniuk ressaltou que, sem a regeneração florestal obtida através da dispersão de sementes, serviços essenciais, como a provisão de água de qualidade, ficam comprometidos. A gerente de sementes explicou que a restauração de matas ciliares com o plantio de espécies nativas garante a manutenção dos recursos hídricos, prevenindo erosão e sedimentação dos rios. Muitas vezes, essas espécies são cultivadas a partir de sementes coletadas por indígenas.
Outro efeito positivo das redes, apontado por Aline Smychniuk, é a manutenção cultural, como o resgate de saberes tradicionais e a valorização das comunidades que vivem da floresta e conhecem as espécies nativas. “Ao investir em redes de sementes, asseguramos que esses serviços ecossistêmicos vitais continuem a sustentar a biodiversidade e a qualidade de vida humana”, afirma.
Entre os 15 indígenas selecionados para participar da formação de multiplicadores estava o coletor de sementes da Reseba e cacique da aldeia Bejarana do povo Karitiana, Brenno Karitiana. Ao lado de indígenas de outras 10 etnias (Xucuru, Pataxó, Krikati, Xacriabá, Guajajara, Tupi-Guarani, Kapinawá, Terena, Pankararé e Kumaruara), Brenno pode conhecer o viveiro de mudas da Ecoporé e a aldeia Lapetanha do povo Paiter Suruí, outro povo parceiro da Reseba. Durante a visita ao viveiro, Brenno não escondeu o orgulho de ver as sementes que coletou se transformarem em mudas para a restauração: “eu me senti em casa porque nós vendemos sementes lá dentro. Quando vi as minhas sementes, eu queria pegar nelas”, disse.
Matias Santana da Conceição, indígena Pataxó que participou da formação, também é coletor de sementes. Matias faz parte da Coopajé, que, assim como a Reseba, é uma das 27 redes que compõem o Redário, organização que conecta redes e grupos de coletores para estruturar a base da cadeia de restauração em larga escala. Para Matias, a experiência da formação e o contato com a Ecoporé foram valiosos: “foi riquíssimo, porque vi pontos aqui que eram necessários para minha região e espero que sempre aconteçam esses encontros para que todos aqueles, indígenas e não indígenas, que defendem a Mãe Natureza possam se encontrar, restaurar e cuidar do que vem dela para viver daquilo”, disse.
Passo importante para fortalecer a capacidade dos povos indígenas na gestão autônoma de seus recursos naturais, a Formação de Multiplicadores Indígenas em Restauração Ecológica contará com outros dois módulos. O próximo acontecerá em dezembro na Terra Indígena Barra Velha e o terceiro e último, com data ainda a definir, será com parceiros localizados no Cerrado.
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